RETALHOS CASUAIS
Quando inteira pego fogo,
sem ser verão, sem ser estio,
vasculho os sonhos na hora incerta,
no nascer do corpo, no nascer do cio.
Em carícias, em regaços,
flecho o alvo doce e assisto
em passos lentos, os teus passos,
ruir a desordem da matéria,
quente e lassa,
nas células, o sobrevôo de ternas libélulas.
Quando danço refeita,
depois da festa, depois do riso,
guardo o cheiro, o traço, as vértebras,
de todas as palavras, os versos,
em suma, o resumo para um novo livro.
Recomponho em cacos e versículos,
as manhas que traças em minhas fendas,
quando o sangue de tua carne prevalece,
quando a boca seca-te o poço, trêmula..
Sábia, em noites crescentes,
me abro em concha estelar
e é sempre quando na chuva,
mirrada, me derreter,
será, sempre, quando
frágil, me inundar,
aí, então, só tu
vais me entender,
me acolher
e me secar.
In O AVESSO DO CRISTAL, de Lívia Tucci.
RETAGUARDA
Surram suas costas
e o sangue segue seu talhe,
escorre pela curva,
a que mais se acentua,
segue seu curso
e morre na marca,
onde tudo principia.
E ela deságua
quando os homens desabam
nas argamassas, nos orgasmos,
no terreno mais temido.
Os homens se embrenham, por instinto,
em tudo que é proibido.
E uma mulher obediente,
nessa hora, cede tudo:
seus músculos,
seu íntimo, seu absoluto.
E outra vez,
essa mulher se traça
humilde, num abraço
e ninguém vê
a vaga resignação
no seu olhar,
quando abre a porta
e murmura: “Entrai e comei.
A casa é tua.”
Do livro "O Avesso do Cristal",by Lívia Tucci
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